O Informativo 792 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), publicado em 24 de outubro de 2023, traz os seguintes julgados:
1) Recursos Repetitivos – Direito Penal – Estupro de vulnerável em continuidade delitiva e majoração da pena
2) Recursos Repetitivos – Direito Penal – Natureza jurídica do crime de apropriação indébita previdenciária
3) Recursos Repetitivos – Direito Penal – Possibilidade de reconhecimento da reincidência pelo juízo da execução penal
4) Direito Administrativo – Obrigatoriedade de publicação de edital de credenciamento
5) Direito Civil – Prescrição da pretensão impede a cobrança judicial e extrajudicial
6) Direito do Consumidor – Publicidade do tipo puffing não é considerada propaganda enganosa
7) Execução Penal – Recusa do detento em aceitar alimento e configuração de falta grave
8) Direito Penal e Direito Processual Penal – Possibilidade de espelhamento do Whatsapp Web
Abaixo você pode conferir cada julgado, na ordem que citamos acima, com seu contexto, decisão do STJ e dica de prova.
1) Recursos Repetitivos – Direito Penal – Estupro de vulnerável em continuidade delitiva e majoração da pena
Estupro de vulnerável. Continuidade delitiva. Número indeterminado de atos sexuais. Crimes praticados por longo período de tempo. Recorrência das condutas delitivas. Pratica inequívoca de mais de 7 repetições. Fração máxima de majoração da pena. Possibilidade. REsp 2.050.195-RJ, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 17/10/2023 (Tema 1202.)
Contexto do julgado:
A questão submetida a julgamento sob o rito dos recursos repetitivos diz respeito a um tema que vimos a pouco tempo no informativo 782, que trata da aplicação do aumento de pena no crime de estupro de vulnerável, praticado em continuidade delitiva, quando não é possível delimitar exatamente a quantidade de vezes em que foi praticado o crime.
Lembrando que a continuidade delitiva, prevista no artigo 71 do Código Penal, é instituto da dosimetria da pena concebido com a função de racionalizar a punição de condutas que, embora praticadas de forma independente, estejam inseridas dentro de um mesmo desenvolvimento delitivo.
Dessa forma, por opção legislativa e critérios de política criminal, a lei penal afasta excepcionalmente a rigorosa aplicação do concurso material e impõe uma única punição, ainda que majorada, àqueles casos nos quais os crimes subsequentes possam ser tidos como continuação de um primeiro delito, conforme as condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes. Em síntese, a continuidade delitiva é uma ficção jurídica criada pelo legislador para beneficiar o agente, que em vez de responder por cada crime praticado, responderá por um deles com a pena aumentada de um sexto a dois terços.
No que diz respeito ao crime de estupro de vulnerável, na maioria das vezes, esse é praticado por um familiar da vítima, e ocorre dentro de sua residência, o que são condições que favorecem a repetição silenciosa, cruel e indeterminada de abusos sexuais.
Não raras vezes, cria-se um ambiente de submissão perene da vítima ao agressor, naturalizando-se a repetição da violência sexual como parte da rotina de crianças e adolescentes. Nessas hipóteses, a vítima, completamente subjugada e objetificada, não possui sequer condições de quantificar quantas vezes foi violentada. A violência contra ela deixou ser um fato extraordinário, convertendo-se no modo cotidiano de vida que lhe foi imposto.
Nesses casos, em que não é possível determinar o número exato das condutas delitivas praticadas pelo agressor, estes recorrem pleiteando que seja aplicado a majoração menor prevista no artigo 71, ou seja, aumento de apenas um sexto da pena.
Nos casos em que não haja a delimitação precisa do número de atos sexuais praticados, deve-se aplicar a fração máxima ou mínima prevista no artigo 71 do Código Penal?
Em um dos recursos afetados, a vítima tinha apenas 11 anos de idade no início das condutas delitivas, e foi submetida pelo acusado aos mais diversos tipos de atos libidinosos, de modo frequente e ininterrupto, ao longo de cerca de 4 anos.
Decisão do STJ:
A Terceira Seção do STJ definiu que a torpeza do agressor, que submeteu a vítima a abusos sexuais tão recorrentes e constantes ao ponto de tornar impossível determinar o número exato de suas condutas, evidentemente não pode ser invocada para se pleitear uma majoração menor na aplicação da continuidade delitiva. Nos crimes de natureza sexual, o critério jurisprudencial objetivo para a fixação da fração de majoração na continuidade delitiva deve ser contextualizado com as circunstâncias concretas do delito, em especial o tempo de duração da situação de violência sexual e a recorrência das condutas no cotidiano da vítima, devendo-se aplicar o aumento no patamar que, de acordo com as provas dos autos, melhor se aproxime do número real de atos sexuais efetivamente praticados.
O STJ já havia fixado o entendimento de que para aplicação do aumento decorrente da continuidade delitiva, não é preciso a indicação exata do número de condutas praticadas, sendo preponderante o exame do tempo de duração dos abusos e da sua recorrência.
Assim ficou fixada a tese do tema 1202: “No crime de estupro de vulnerável, é possível a aplicação da fração máxima de majoração prevista no artigo 71, caput, do Código Penal, ainda que não haja a delimitação precisa do número de atos sexuais praticados, desde que o longo período de tempo e a recorrência das condutas permita concluir que houve 7 ou mais repetições.”
Neste julgado o STJ afirmou o entendimento de que não é possível a aplicação da continuidade delitiva entre os delitos de estupro qualificado previsto no artigo 213, parágrafo 1º, do Código Penal, e estupro de vulnerável previsto no artigo 217-A do Código Penal, pois se tratam de tipos penais que tutelam bens jurídicos diversos e que possuem circunstâncias elementares bastante distintivas. Enquanto o estupro de vulnerável tutela a dignidade sexual e o direito ao desenvolvimento da personalidade livre de abusos, o estupro qualificado tutela a liberdade sexual e o direito ao exercício da sexualidade sem coações. Desse modo, deve-se aplicar o concurso material entre os delitos de estupro qualificado e estupro de vulnerável.
Dica de prova:
Para consolidar o que acabamos de escutar sobre o tema 1202, responda se está certo ou errada a seguinte afirmativa, de acordo com a tese firmada pelo STJ:
No crime de estupro de vulnerável, é possível a aplicação da fração máxima de majoração prevista no artigo 71, caput, do Código Penal, ainda que não haja a delimitação precisa do número de atos sexuais praticados, desde que o longo período de tempo e a recorrência das condutas permita concluir que houve sete ou mais repetições.
Certa ou errada?
Afirmativa certa!
Nos encontramos novamente no próximo áudio! Até lá!
2) Recursos Repetitivos – Direito Penal – Natureza jurídica do crime de apropriação indébita previdenciária
Apropriação indébita previdenciária. Art. 168-A, § 1º, I, do Código Penal. Crime material. Consumação com a constituição definitiva do crédito tributário. Incidência da Súmula Vinculante n. 24 do STF. Reafirmação do entendimento sedimentado no STJ. REsp 1.982.304-SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 17/10/2023, DJe 20/10/2023 (Tema 1166).
Contexto do julgado:
A questão submetida a julgamento sob o rito dos recursos repetitivos visa definir qual a natureza jurídica, se formal ou material, do crime de apropriação indébita previdenciária, previsto no artigo 168-A do Código Penal.
É prevista a pena de reclusão, de dois a cinco anos, e multa, para quem “Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional”.
O parágrafo 1º, inciso I do artigo 168-A prevê que “Nas mesmas penas incorre quem deixar de recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público.”
Mas qual a importância de definir qual a natureza jurídica desse delito?
A importância está em se definir a data da consumação do crime e no termo inicial da prescrição.
Por exemplo, um empregador desconta de seu empregado a cota parte do INSS, mas não recolhe esse valor aos cofres públicos. Esses descontos ocorreram entre janeiro de 2007 e janeiro de 2009. Porém a constituição definitiva do crédito tributário se deu em novembro de 2013, e o recebimento da denúncia se deu em abril de 2021.
Se o entendimento for de que o crime tem natureza formal, o crime se consumou na data em que deixou de ser feito os repasses, de janeiro de 2007 a janeiro de 2009, de modo que já estaria prescrito o crime.
No entanto, se o entendimento for de que o crime de apropriação indébita previdenciária tem natureza material, só se consumando com a constituição definitiva do crédito tributário, o crime não estaria prescrito, pois não houve transcurso de prazo superior a 12 anos, conforme artigo 109 do Código Penal.
Decisão do STJ:
A Súmula Vinculante 24 do STF estabelece que “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no artigo 1º, incisos I a IV, da Lei 8.137 de 1990, antes do lançamento definitivo do tributo”. Assim, os crimes citados na súmula vinculante 24 são considerados crimes materiais, sendo necessária a redução ou supressão do tributo e, consequentemente, a constituição do crédito tributário definitivo como condição para a persecução penal.
Apesar de a Súmula Vinculante 24 tratar expressamente dos delitos previstos no artigo 1º, inciso I a IV, da Lei 8.137, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que a sistemática de imputação penal por crimes de sonegação contra a Previdência Social deve se sujeitar à mesma lógica aplicada àqueles contra a ordem tributária em sentido estrito.
Assim, o STJ reafirmando seu entendimento, fixou a seguinte tese no tema 1166 dos Recursos Especiais Repetitivos: “O crime de apropriação indébita previdenciária, previsto no artigo 168-A, parágrafo 1º, inciso I, do Código Penal, possui natureza de delito material, que só se consuma com a constituição definitiva, na via administrativa, do crédito tributário, consoante o disposto na Súmula Vinculante nº 24 do Supremo Tribunal Federal”.
Dessa forma, no exemplo que demos no início dessa explicação, o crime não estava prescrito, pois o termo inicial da prescrição é a data da constituição definitiva do crédito tributário.
Dica de prova:
Para consolidar o que acabamos de escutar sobre o tema 1166, responda se está certo ou errada a seguinte afirmativa, de acordo com a tese firmada pelo STJ:
O crime de apropriação indébita previdenciária, previsto no artigo 168-A, parágrafo 1º, inciso I, do Código Penal, possui natureza de delito material, que só se consuma com a constituição definitiva, na via administrativa, do crédito tributário, consoante o disposto na Súmula Vinculante nº 24 do Supremo Tribunal Federal.
Certa ou errada?
Afirmativa certa!
Nos encontramos novamente no próximo áudio! Até lá!
3) Recursos Repetitivos – Direito Penal – Possibilidade de reconhecimento da reincidência pelo juízo da execução penal
Reincidência. Ausência de reconhecimento pelo juízo sentenciante. Reconhecimento pelo juízo da execução. Possibilidade. Reafirmação do entendimento sedimentado pela Terceira Seção do STJ no EREsp 1.738.968-MG. REsp 2.055.920-MG, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, por maioria, julgado em 17/10/2023, DJe 20/10/2023. (Tema 1208)
Contexto do julgado:
A questão submetida a julgamento sob o rito dos recursos repetitivos visa definir se a reincidência pode ser admitida pelo juízo das execuções penais para análise da concessão de benefícios, ainda que não reconhecida pelo juízo que prolatou a sentença condenatória.
Na sentença penal condenatória o juízo não reconheceu a reincidência, e consequentemente não aplicou a agravante do inciso I do artigo 61 do Código Penal.
Quando do cumprimento da pena, ao analisar a concessão de benefícios, o juízo das execuções reconheceu a reincidência.
O Tribunal de origem entendeu que não sendo a reincidência da agravante reconhecida em sentença condenatória, é inviável o seu reconhecimento posterior pelo juízo da execução, porquanto consistiria em medida prejudicial ao condenado, sem o devido respeito às garantias do contraditório, ampla defesa e devido processo legal. Em suma, não seria cabível o reconhecimento da reincidência pelo Juízo da execução.
Vamos ver se o STJ concordou com esse entendimento.
Decisão do STJ:
Não, o STJ não concordou com o entendimento do Tribunal de origem. Na verdade, o STJ já tem o entendimento pacificado no sentido de que a intangibilidade da sentença penal condenatória transitada em julgado não retira do Juízo das Execuções Penais o dever de adequar o cumprimento da sanção penal às condições pessoais do réu.
E a reincidência é um fato, relativo à condição pessoal do condenado, que não pode ser desconsiderado pelo juízo da execução, independente da sua menção na sentença condenatória, pois afetaria exponencialmente o bom desenvolvimento da execução da pena traçado nas normas correspondentes.
Assim, ainda que não reconhecida na condenação, a reincidência deve ser observada pelo Juízo das Execuções para concessão de benefícios, sendo descabida a alegação de reformatio in pejus ou de violação da coisa julgada, pois se trata de atribuições distintas. Há, na verdade, a individualização da pena relativa à apreciação de institutos próprios da execução penal.
Diante disso, o STJ reafirmando seu entendimento, fixou a seguinte tese no tema 1208 dos Recursos Especiais Repetitivos:” A reincidência pode ser admitida pelo juízo das execuções penais para análise da concessão de benefícios, ainda que não reconhecida pelo juízo que prolatou a sentença condenatória.”
Dica de prova:
Para consolidar o que acabamos de escutar sobre o tema 1208, responda se está certo ou errada a seguinte afirmativa, de acordo com a tese firmada pelo STJ:
A reincidência pode ser admitida pelo juízo das execuções penais para análise da concessão de benefícios, desde que reconhecida pelo juízo que prolatou a sentença condenatória.
Certa ou errada?
Afirmativa errada! Segundo a tese firmada pelo STJ, ainda que a reincidência não tenha sido reconhecida pelo juízo que prolatou a sentença condenatória, ela pode ser admitida pelo juízo das execuções penais.
Nos encontramos novamente no próximo áudio! Até lá!
4) Direito Administrativo – Obrigatoriedade de publicação de edital de credenciamento
Licitação na modalidade de leilão. Discricionariedade administrativa na forma de contratação de leiloeiro oficial pelo poder público. Art. 31, caput e § 1º da Lei n. 14.133/2021. Divulgação pública e permanente de edital de credenciamento em sítio eletrônico. Obrigação decorrente do art. 79, parágrafo único, I, da Lei n. 14.133/2021. Inaplicabilidade aos chamamentos públicos realizados sob a égide da Lei n. 8.666/1993. RMS 68.504-SC, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 10/10/2023, DJe 16/10/2023.
Contexto do julgado
A nova lei de licitações e contratações administrativas, lei 14.133 de 2021, trouxe a previsão de que se a Administração Pública optar pela realização de leilão por intermédio de leiloeiro oficial, deverá selecioná-lo mediante credenciamento ou licitação na modalidade pregão.
Em relação ao credenciamento, a referida lei impõe no seu artigo 79, parágrafo único, inciso I, que a Administração Pública deve manter, de forma pública, edital de credenciamento em sítio eletrônico, de modo a permitir o cadastramento permanente de novos interessados.
No caso concreto, em 2021, um leiloeiro pretendia se habilitar para exercer a atividade de leiloeiro oficial em uma secretaria de um determinado estado da federação. Esse leiloeiro teve sua inclusão na lista dos leiloeiros negada, tendo em vista que o último cadastramento foi realizado em 2014, quando foram habilitados 13 interessados.
Esse leiloeiro impetrou mandado de segurança pretendendo sua inclusão na lista de credenciados, ou subsidiariamente, a expedição de ordem mandamental para que o Secretário Estadual publique Edital de credenciamento, já que a nova lei dispõe que Administração Pública é obrigada a divulgar, permanentemente, edital de credenciamento de leiloeiros públicos.
A Administração Pública é obrigada a manter permanentemente esse edital de credenciamento?
Vamos ver qual foi a decisão da Primeira Turma do STJ.
Decisão do STJ:
A publicação permanente de instrumento convocatório para cadastramento somente passou a ser obrigatória por força do artigo 79, parágrafo único, I, da Lei 14.133 de 2021, sendo inaplicável aos chamamentos públicos realizados sob a égide da lei 8.666 de 93.
E, além de a Administração Pública ser obrigada a divulgar, permanentemente, edital de credenciamento em sítio eletrônico somente após a vigência da Nova Lei de Licitações e Contratações Administrativas, a obrigação de publicar esse edital só incidirá quando for comprovado que a Administração Pública optou pela modalidade de seleção de leiloeiros mediante credenciamen to.
Isto porque, a Administração pode designar um servidor para a realização de leilão, ou pode optar pela realização de leilão por intermédio de leiloeiro oficial. Se a Administração optar por leiloeiro oficial, deverá selecioná-lo mediante credenciamento ou licitação na modalidade pregão. De modo que, somente na modalidade credenciamento há a previsão de manutenção pública de edital de credenciamento em sítio eletrônico, de modo a permitir ao cadastramento permanente de novos interessados.
Dica de prova:
Responda se a seguinte afirmativa está certa ou errada de acordo com o julgado que acabamos de estudar:
A Administração Pública é obrigada a divulgar, permanentemente, edital de credenciamento em sítio eletrônico somente após a vigência da Nova Lei de Licitações e Contratações Administrativas.
Então, certa ou errada?
Afirmativa certa!
Espero você no próximo Emáudio! Até lá!
5) Direito Civil – Prescrição da pretensão impede a cobrança judicial e extrajudicial
Débito prescrito. Cobrança judicial e extrajudicial. Instituto de direito material. Plano da eficácia. Princípio da indiferença das vias. Prescrição que não atinge o direito subjetivo. Cobrança de dívida prescrita. Impossibilidade. REsp 2.088.100-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 17/10/2023.
Contexto do julgado
Imagine a seguinte situação: o Sr. José tem uma dívida com o banco Pedra Preta, mas essa dívida já está prescrita, o que significa que o credor não pode cobrá-la judicialmente.
O banco Pedra Preta vende esse crédito para uma empresa de recuperação de créditos, que passa a infernizar a vida do sr. José com diversas ligações telefônicas por dia cobrando a dívida.
A empresa de recuperação de crédito que comprou essa dívida prescrita, que são chamados de créditos podres, pode cobrar extrajudicialmente o Sr. José?
Vamos ver qual foi o entendimento do STJ.
Decisão do STJ:
Segundo o entendimento da Terceira Turma do STJ, o reconhecimento da prescrição da pretensão impede tanto a cobrança judicial quanto a cobrança extrajudicial do débito.
Para entender esse julgado, precisamos de nos desapegar, esquecer na verdade, de uma coisa que muitas vezes escutamos na faculdade, de que a “prescrição fulmina o direito de ação.”
A prescrição, na realidade atinge a pretensão, que é instituto de direito material, e não a ação.
E o que é a pretensão? É o poder de exigir um comportamento positivo ou negativo da outra parte da relação jurídica. E a pretensão nasce quando o titular pode exigir um fazer ou um não fazer do obrigado.
No nosso exemplo, quando o Sr. José contratou o empréstimo com o banco, já existia o dever e o direito, o dever do Sr. José pagar a dívida na data aprazada, e o direito do banco receber. E a pretensão? A pretensão nasceu para o banco na data que venceu a dívida e o Sr. José não pagou. Assim, o banco poderia realizar a cobrança pela via judicial ou extrajudicial. Assim, ao cobrar extrajudicialmente o devedor, o credor está, efetivamente, exercendo sua pretensão.
E como a prescrição atinge a pretensão, e se a pretensão está encoberta pela prescrição, o seu titular não pode se valer da via judicial e nem mesmo da via extrajudicial para realizar a cobrança, pois a pretensão se submete ao princípio da indiferença das vias.
Ou seja, se o credor cobrar extrajudicialmente o devedor, o credor está, efetivamente, exercendo sua pretensão, ainda que fora do processo. E se o crédito está prescrito, não é mais possível cobrar a dívida.
Vamos supor que o Sr. José não sabia desse entendimento do STJ e pagou a dívida prescrita, ele pode ajuizar ação alegando pagamento indevido? Não, claro que não! Isso porque a prescrição fulminou a pretensão e não o direito subjetivo, que no nosso exemplo é o crédito. O crédito continua a existir, o que não existe mais é a possibilidade de exigi-lo.
Dica de prova:
Responda se a seguinte afirmativa está certa ou errada de acordo com o julgado que acabamos de estudar:
O reconhecimento da prescrição da pretensão impede tanto a cobrança judicial quanto a cobrança extrajudicial do débito.
Então, certa ou errada?
Afirmativa certa!
Espero você no próximo Emáudio! Até lá!
6) Direito do Consumidor – Publicidade do tipo puffing não é considerada propaganda enganosa
Condicionador de ar. Propaganda enganosa. Publicidade enaltecendo a característica de ser silencioso. Danos morais coletivos. Ausência de prejuízo ao consumidor. REsp 1.370.677-SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 17/10/2023.
Contexto do julgado
No ano de 1989 uma determinada empresa de ar-condicionado veiculou uma propaganda na qual dizia que os seus condicionadores de ar eram silenciosos.
O Ministério Público Federal ajuizou Ação Civil Pública alegando que a propaganda era enganosa, pois os aparelhos de ar-condicionado produziam ruídos, o que foi comprovado por perícia no processo. Então, se produzia ruídos não era silencioso como dizia a propaganda.
As instâncias ordinárias reconheceram que a propaganda era enganosa.
Esse tipo de publicidade que enaltece, com exagero, certa característica do produto é chamada de puffing.
A questão a ser decidida pelo STJ neste processo é se a publicidade do tipo puffing pode ser considerada propaganda enganosa.
Vamos escutar qual foi a decisão do STJ.
Decisão do STJ:
A Quarta Turma do STJ, por unanimidade, decidiu que a publicidade do tipo puffing, cuja mensagem enaltece o fato de um aparelho de ar condicionado ser “silencioso”, não tem aptidão para ser fonte de dano difuso, pois não ostenta qualquer gravidade intolerável em prejuízo dos consumidores em geral.
Segundo a doutrina, o puffing não está proibido enquanto apresentado como publicidade espalhafatosa, cujo caráter subjetivo ou jocoso não permite que seja objetivamente encarada como vinculante. É o anúncio em que se diz ser o melhor produto do mercado, por exemplo.
No caso concreto, entendeu-se que não se deve considerar tratar-se o termo “silencioso”, enfatizado na propaganda, como uma afirmação literal. Dizer ser o aparelho silencioso, nas condições tecnológicas da época, em que os condicionadores de ar de gerações anteriores produziam mais ruído, era mero exagero publicitário comparativo, destinado a enaltecer essa característica específica do produto, decorrente de inovação tecnológica e, portanto, o mote da publicidade, em tal contexto, não seria apto, por si, a enganar ou induzir o consumidor a um efetivo engano. Até porque o consumidor, movido por natural curiosidade, certamente testava o nível de ruído do produto antes da compra.
Atualmente não tem um ar-condicionado que seja totalmente silencioso, imagine no ano de 1989.
Assim, o STJ entendeu que não houve dano moral coletivo, pois a publicidade cuja mensagem enaltece o fato de ser o aparelho de ar condicionado “silencioso”, não tem aptidão para ser fonte de dano difuso, pois não ostenta qualquer gravidade intolerável em prejuízo dos consumidores em geral.
Dica de prova:
Vamos praticar! Responda se está certa ou errada a seguinte afirmativa, de acordo com o julgado que acabamos de estudar:
A publicidade do tipo puffing, cuja mensagem enaltece o fato de um aparelho de ar condicionado ser “silencioso”, não tem aptidão para ser fonte de dano difuso, pois não ostenta qualquer gravidade intolerável em prejuízo dos consumidores em geral.
Então, certa ou errada?
Afirmativa certa! Lembre-se que no informativo 765 comentamos um julgado em que a Unilever, que usa o slogan “Hellmann’s, a verdadeira maionese”, que é um tipo de puffing, estava questionando a Heinz, que usa na publicidade de seus produtos o slogan: “Melhor em tudo que faz.”, que também é um puffing, e o STJ reconheceu que é licita esse tipo de publicidade.
Espero você no próximo Emáudio! Até lá!
7) Execução Penal – Recusa do detento em aceitar alimento e configuração de falta grave
Recusa do detento em aceitar alimento que julgou impróprio. Falta grave. Art. 50, I, da LEP. Não ocorrência. Exercício dos direitos fundamentais. Previsão do art. 41, I e VII, da Lei n. 7.210/1984 (Lei de Execução Penal). Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 17/10/2023.
Contexto do julgado
Um detento se recusou a aceitar alimento que julgou impróprio para consumo.
O artigo 50, inciso I, da Lei de Execução Penal estabelece que comete falta grave o detento condenado à pena privativa de liberdade que incitar ou participar de movimento para subverter a ordem ou a disciplina.
A questão a ser decidida neste processo pelo STJ é se essa recusa do detento em receber alimento pode configurar falta grave.
Decisão do STJ:
Para configurar a falta grave prevista no artigo 50, inciso I, da Lei de Execução Penal o detento deve envolver-se ativamente, cooperar ou contribuir para a realização de um movimento que tenha o propósito de desestabilizar a ordem ou a disciplina. O detento que incita, ou seja, que estimula, motiva ou encoraja outros indivíduos a praticar atos de subversão ou indisciplina de forma coletiva, também será responsabilizado por essa infração.
No caso de greve de fome, esta pode, em determinadas circunstâncias, caracterizar a falta grave prevista na lei, especialmente se o movimento resultar na configuração do crime de motim de presos, ou no crime de dano ao patrimônio público. Em tais situações, a recusa deliberada em se alimentar pode ser considerada parte de um movimento que busca subverter a ordem ou a disciplina no estabelecimento prisional, sujeitando os envolvidos às sanções correspondentes.
Porém, quando a recusa do detento em aceitar o alimento se deve ao fato que ele julga que o alimento é impróprio para consumo, isso não configura falta grave, pois não há no ordenamento jurídico vigente qualquer imposição que obrigue o indivíduo privado de liberdade a ingerir alimentos em circunstâncias que considere inadequadas.
E a recusa em aceitar o alimento se dá de forma pacífica e sem ameaçar a segurança do ambiente carcerário, representa um exercício do direito à liberdade de expressão por parte do detento, direito esse amparado pelo próprio ordenamento jurídico no artigo 5º, inciso IV, da Constituição da República.
E a alimentação suficiente e a assistência material e à saúde são direitos do preso, previstos na Lei de Execução Penal, de modo que, a recusa em ingerir alimentos inadequados está intrinsecamente ligada à obrigação legal de proporcionar alimentação suficiente e está relacionada diretamente à assistência material e à saúde do detento.
Dica de prova:
Vamos praticar! Responda se está certa ou errada a seguinte afirmativa, de acordo com o julgado que acabamos de estudar:
A recusa do detento em aceitar alimento que julga impróprio para consumo, quando realizada de forma pacífica e sem ameaçar a segurança do ambiente carcerário, não configura falta grave.
Então, certa ou errada?
Afirmativa certa!
Nos encontramos no próximo áudio! Até lá!
8) Direito Penal e Direito Processual Penal – Possibilidade de espelhamento do Whatsapp Web
Agente infiltrado no plano cibernético. Espelhamento de mensagens via Whatsapp web. Possibilidade. Desde que observada a cláusula de reserva de jurisdição. Critérios de proporcionalidade (utilidade, necessidade). AREsp 2.309.888-MG, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 17/10/2023.
Contexto do julgado
A questão discutida nesse recurso é possível a utilização, no ordenamento jurídico pátrio, de ações encobertas, controladas virtuais ou de agentes infiltrados no plano cibernético. E se dentro dessa ação controlada na investigação criminal é possível o espelhamento do WhatsApp Web.
No caso concreto o Ministério Público estava investigando a atuação de um bando armado voltado a atentados contra policiais militares. O MP aviou representação pelo deferimento de ações controladas de investigação, destinadas ao desmantelamento de associação criminosa. Ainda, requereu, especificamente, a interceptação telefônica e quebra de sigilo de comunicações de terminais telefônicos possivelmente utilizados para a prática de crimes pela mencionada organização criminosa, visando desmantelá-la, o que foi autorizado judicialmente.
Na ação controlada houve o espelhamento do WhatsApp Web dos investigados, que alegam a ilicitude dessa prova.
Decisão do STJ:
A Quinta Turma do STJ, por unanimidade, decidiu que é possível a utilização, no ordenamento jurídico pátrio, de ações encobertas, controladas virtuais ou de agentes infiltrados no plano cibernético, inclusive via espelhamento do Whatsapp Web, desde que o uso da ação controlada na investigação criminal esteja amparado por autorização judicial.
A Lei 12.850 de 2013, que define organização criminosa e dispõe sobre investigação criminal, prevê que, em qualquer fase da persecução penal, serão permitidos, sem prejuízo de outros procedimentos já previstos em lei, infiltração, por policiais, em atividade de investigação, mediante motivada e sigilosa autorização judicial. E o espelhamento do Whatsapp Web é um tipo de infiltração, uma infiltração a distância, virtual, na qual se tem acesso aos elementos de prova, podendo-se esperar o momento mais oportuno para realizar as prisões dos criminosos.
Segundo o STJ, a potencialidade danosa dos delitos praticados por organizações criminosas, pelo meio virtual, aliada a complexidade e dificuldade da persecução penal no âmbito cibernético devem levar a jurisprudência a admitir as ações controladas e infiltradas no mesmo plano virtual.
Assim, ficou decidido que não há empecilho na utilização de ações encobertas ou agentes infiltrados na persecução de delitos, pela via dos meios virtuais, desde que, conjugados critérios de proporcionalidade, reste observada a subsidiariedade, não podendo a prova ser produzida por outros meios disponíveis.
Dica de prova:
Vamos praticar! Responda se está certa ou errada a seguinte afirmativa, de acordo com o julgado que acabamos de estudar:
O agente policial pode valer-se da utilização do espelhamento pela via do Whatsapp Web, desde que respeitados os parâmetros de proporcionalidade, subsidiariedade, controle judicial e legalidade, calcado pelo competente mandado judicial.
Então, certa ou errada?
Afirmativa certa!
Foi um prazer estudar com você este informativo. Nos encontramos no próximo áudio!
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No aplicativo EmÁudio Concursos, você pode ouvir todos os informativos do STJ (e do STF) com todos os detalhes que trouxemos aqui: julgado, contexto do julgado, decisão do STJ e dica de prova!
O melhor é que você pode ouvir enquanto faz as suas atividades da rotina, como no trajeto de ida e volta para casa, praticando algum exercício físico, limpando a casa, entre tantas outras possibilidades.
Ou seja: ao ouvir os informativos, além de se atualizar constantemente e fixar o conteúdo com mais facilidade, você ainda GANHA TEMPO DE ESTUDO! Isso é um combo perfeito para um concurseiro!
Quer experimentar e ver como é?
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Além dos informativos do STJ e STF comentados, você ainda encontra no app EmÁudio:
• Cursos regulares com aulas em áudio dos melhores professores do país
• Legislações narradas com voz humana e sempre atualizadas
• Podcasts e notícias em tempo real
• E muito mais! É o catálogo mais completo de educação em áudio que existe!
Então, baixe agora o EmÁudio Concursos no seu celular e experimente grátis! As primeiras aulas das matérias são liberadas para você conhecer e ver como funciona! 😉